terça-feira, 5 de outubro de 2010

O que você pensa do "eu-achismo"?

“Uma coleção de pensamentos deve ser uma farmácia moral, onde se encontrem remédios para todos os males”. (Voltaire).

O convite à reflexão está baseado numa realidade atual e crescente: o desprezo pelos pensamentos universais que estão escudados na história e que, portanto, servem de referência para os indivíduos; ao mesmo tempo em que emerge a entronização dos novos conceitos introduzidos pelas teorias da “auto-ajuda”.

É interessante a singularidade da inteligência dos difusores desse novo conceito. A solução para cada pessoa está na própria pessoa. Auto-ajuda! Bonito de se ouvir? Fácil de praticar? Promove resultados reais?

A auto-ajuda veio para corroborar a teoria do “eu acho”. As pessoas agora acham tudo. Acham que viram Deus, que conhecem de Deus, que conhecem a si mesmas, que conhecem dos outros. Acham que conhecem do ateísmo e do agnosticismo, do criacionismo em suas múltiplas faces. Nunca foi tão fácil “saber das coisas” e nunca foi tão simples promover soluções. Cada um tem seu receituário que é sob medida e gosto.

A farmácia moral de Valtaire está fechada. As coletâneas de pensamentos estão individualizadas. Cada um acha o que convém e adota procedimentos que são convenientes. Essa conveniência individual quase sempre entra em trajetória de colisão com a conveniência do outro. Sim, o outro também “acha” e tem o seu próprio compêndio de pensamentos.

O “eu-achismo” invadiu os salões de festas, as mesas de bar, os santuários da moralidade e as igrejas. Igrejas também? Sim, claro. Cada religião é um centro de “eu-achismo” freqüentado por “eu-achistas”. Deus hoje é como roupa de alfaiate que é elaborada com tesoura, agulha e linha.

Observem que muitas vezes alguém apresenta um argumento sério, resultado de pesquisas e ponderações. Eis que alguém diz: “não concordo com isso”, “eu “acho” que não é assim...”.

De achismo em achismo a humanidade descamba, ao arrepio das boas maneiras, em direção ao caos.

Será que temos condições de fazer algo para mudar o quadro que se apresenta? Ou será que chega o momento que sentimos vontade de desistir? Como tentar conduzir pessoas à racionalidade se elas não querem? Como tentar promover a realidade se as pessoas querem a comodidade do desconhecimento? Como incentivar o livre pensar se as pessoas preferem acreditar cegamente nos argumentos do “eu-achismo”?

Enéias Teles Borges - Autor
Postagem original: 02/06/2008.
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6 comentários:

Ricardo disse...

Enéias,

Eu “ACHO” que o achismo é maior hoje em dia simplesmente porque com a popularização da informação há mais gente pensando e, portanto, produzindo novas idéias.

Na verdade o problema esta no fato de que “todos querem ter opiniões, mas poucos sabem pensar”.

Quanto aos “pensamentos universais”, citados por você, um dia eles foram o achismo de alguém que, por causa de sua eloqüência, força de imposição ou incompetência da oposição, tornou-se parâmetro para muitos.

A prova de que não se pode mais impedir a expansão do achismo são esses nossos blogs, onde cada um tem o direito de empestear o mundo com seus pensamentos, por mais heréticos e controversos que possam parecer.

E viva o “eu-achismo”!

Cleiton Heredia disse...

Existe uma substancial diferença num ponto de vista ou uma opinião defidamente embasado no estudo, pesquisa e coerente reflexão lógica, de um outro ponto de vista ou opinião proveniente de pessoas que possuem apenas um conhecimento superficial do assunto, e o que é pior, por pouco conhecerem acham que muito sabem.

Não considero os "pensamentos universais" como simples "achismos", quando estes são fruto de estudo diligente, pesquisa adequada e pensamentos lógicos e coerentes.

O que mais me aborrece não é o fato das pessoas expressarem o que acham, mas a arrogância que geralmente acompanham seus pensamentos.

Ricardo disse...

Cleiton,

Você tem razão. Quanto aos “pensamentos universais”, apesar de um dia eles terem sido o achismo de alguém, podem ter se firmado por serem pura e simplemente a expressão da verdade, e não apenas por causa da eloqüência de quem o formulou, ou por sua força de imposição, ou ainda pela incompetência da oposição.

CH disse...

Acho interessante como cada um, em uma discussão, parte do princípio de que está certo e que precisa, a qualquer custo, "vencer" a opinião de outrem. Ou seja, não se busca a evolução do pensamento via confronto de idéias mas sim a satisfação do ego. Tão desnecessário dizer que há exceções quando enfatizar sua raridade.

Por isso que vemos muitos "debates" terminando com "Ok, mas é só sua opinião".

Concordo que há muito mais informação disponível mas não acho que isso está fazendo as pessoas pensarem mais. Ao contrário. Incapazes de "filtrar" e pensar sobre essa informação toda, aceitam-na e criam milhões de "mundinhos" onde sua visão é soberana.

Sabrina Noureddine disse...

Concordo com o Carlos, o excesso de informação não está fazendo com que as pessoas pensem mais, mas acabam reproduzindo essas informações com suas opiniões, que, na maioria das vezes, não possui respaldo algum, é "achismo".
Entretanto, o embate das idéias, mesmo que cada uma das pessoas não aceite a idéia do outro, ajuda a ampliar os pontos de vista e, por que não? também a desenvolver o raciocínio naquelas que ainda não o fazem?

Anônimo disse...

"Acho também maravilhoso achar...", já dizia o grande João Ubaldo Ribeiro, no seu texto "Escrevendo Muderno" (sic!)

Ou seja, é maravilhoso pra cada um. Pro outro, nunca o é.

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