segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Há deus para todos?

Deus existe de uma forma ou de outra! Ou porque é o Todo-Poderoso dos criacionistas ou por ser invenção humana. Que ele existe não há dúvida!

Certamente você já ouviu ou leu uma frase como esta. E pode ser que tenha lhe ocorrido pensar ser, o conhecimento a respeito de Deus (ou deus), oriundo de uma política humana ou como preferem alguns: fruto de uma instituição de poder temporal que se diz representante de uma divindade (poder eterno).

Parece irônico, mas pensar deus como criação humana é admitir a sua existência, ainda que não seja o Deus todo-poderoso. O deus, criação humana, muitas vezes está revestido de um ideário, que é, de fato, um jogo do poder. Há conveniência na existência de deus (ainda que seja humano). É, na mais simples das hipóteses, um “deus freio social”. No universo humano do poder, este freio social é uma das formas salutares de preservação da paz, aceitação da desigualdade entre os homens e implementação da esperança. O deus humano oferece aos homens o mesmo futuro do Deus todo-poderoso.

O deus humano habita o coração daqueles que são manipulados. Inocentes seres que vivem à mercê dos intelectos mais favorecidos pelas circunstâncias da vida. É um deus de face dúbia. Que permite tudo, anula o ser humano, tem sempre um plano para todos. Este deus dos homens consegue fazer o pobre esperançoso de riqueza e o rico esperançoso de mais riqueza. Riqueza e vida eterna: uma promessa fantástica do deus humano.

O deus humano explica tudo: a origem do mal e a despeito de ser único criador, nega a criação do pecado. O pecado, ensina este deus, nasceu em decorrência da evolução. É resultante do afastamento da fonte do bem. Até nem existe o mal! Ele é simplesmente o afastamento do bem. Como se depreende o deus, criatura humana, explica o que parece inexplicável para os seres pensantes. E este deus humano diz mais: nem todas as coisas podem ser entendidas pelos homens, somente por quem está acima das criaturas. Não é fabuloso que o deus, criação humana, se arvore à condição de minimizar a capacidade do homem (que o criou?)? Eis inebriante característica do deus, invenção humana: a capacidade de superar o seu criador.

Voltando à pergunta: há deus para todos?

Sim, há e nas suas múltiplas formas. Notaram que todo grupamento humano tem o seu deus? E que cada deus é diferente um do outro? Poderia se falar em interpretação humana, mas é assim mesmo? No universo dos criacionistas existe um artífice. Só que cada grupo mostra este deus a seu gosto interpretativo. É deus que manda matar e morrer, perdoar e condenar. Tudo de acordo com o “estatuto” daquele agrupamento, que, como os demais se julga o povo especial, diletante – o remanescente daquele deus...

Não restam dúvidas (em meu refletir) de que há deus para todos. Quem quiser poderá adotar um, entre os já existentes, ou criar o seu deus. Será, sem dúvida, um deus criado à imagem do seu “criador”. O criador deste deus haverá de querer fortuna e glória (mental e espiritual). Quererá, por certo, uma vida eterna e repleta de prazeres. Cada deus criado propiciará uma gama de prazeres que seja adequada ao gosto do seu redimido. Que maravilha! O homem cria um deus, que o redime e lhe traz incomensurável mundo de prazeres...

E o Deus Todo-Poderoso?

O que posso afirmar (em minha reflexão) é que este Deus todo-poderoso não é oriundo de interpretação (criação) humana. A Ele encontram-se ligados os seres pensantes, aqueles que rejeitam a manipulação. É como se fosse um único pastor conduzindo um único rebanho. Não há que se falar em remanescente de Deus – todos são. Aqueles que estão unidos ao Deus todo-poderoso têm uma visão clara na mente e na vida. O verdadeiro Deus é igual para todos. Se for diferente não será o Deus (todo poderoso) e sim o deus (inventividade humana).

Podemos concluir: há deus e há Deus. Qual será o nosso? O que conduz um só rebanho ou é um daqueles que têm resposta ao gosto do crente? Resposta ao gosto de cada credo, cada instituição (...)?

São poucos os que têm o Deus todo-poderoso. Pois este maravilhoso Ser está desvinculado de instituições e movimentos humanos. Está no coração do seu povo. Povo espalhado pelo mundo, participante em diferentes contextos...

Nota: Eu poderia editar o texto acima, mas os comentários postados aqui e recebidos por e-mail, fizeram-me digitar esta nota e trazer mais uma reflexão para o leitor: a forma como apresentei o Todo-Poderoso. Esta interpretação não estando correta provocará um surgimento de um "deus" à minha imagem ou ao meu desejo.

Enéias Teles Borges
Texto original: 26/01/2008
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9 comentários:

Anônimo disse...

Após ler o seu texto (muito bem escrito, diga-se de passagem), as perguntas que me lampejam na mente são:

A Bíblia dos judeus (VT) revela o Deus Todo-Poderoso ou deus invenção humana?

A Bíblia dos Cristãos (VT interpretado a partir do NT) revela Deus ou deus?

E o Alcorão dos mulçumanos, o Rig-Veda dos hindus, o Mahabahata dos brhamas, o Zend Avesta dos zoroastras, o Guru Granth Sahib dos Sikkis, e os livros de Allan Kardec dos espíritas kardecistas? As revelações contidas nestes livros considerados sagrados revelam o Deus Todo-Poderoso ou o deus invençao humana?

Se formos perguntar para cada adepto dos segmentos religiosos acima mencionados, não tenho a menor dúvida que cada um dirá que a sua revelação (o seu livro sagrado) é que contém a revelação do Deus Todo-Poderoso e os demais é que são fruto de imaginação humana (ou até demoníaca para alguns).

Mas e para o observador que chega de fora e procura sinceramente uma revelação do Deus Todo-Poderoso? Onde encontrá-la se todos pretendem a mesma coisa, mas são entre si tão antagônicos?

Ou será que devo concluir que o Deus Todo-Poderoso existe, mas não se revela da maneira como cada um destes segmentos pretende?

Ricardo disse...

O fato do "Deus todo poderoso" estar no coração do seu povo, desvinculado de instituições e movimentos humanos, ainda não o faz ser o Deus existencial. O Criador de tudo o que existe. Esse Deus com "D" maiúsculo não passa a ser real pelo simples fato de pessoas inteligentes, não manipuláveis... acreditarem nele.
A existência de Deus será inquestionável apenas no dia em que Ele se revelar. Enquanto isso não ocorrer, tudo não passa de religião.

Enéias Teles Borges disse...

Caro Ricardo: a sua maneira de pensar é mais uma vertente. o Deus Todo-Podereoso em sua essência já teria se manifestado para alguém ainda vivo? No que diz respeito à manipulção: este é o "calcanhar" de Aquiles. Qual seria este povo que tem Deus no coração? Será que tendo Deus no coração tem consciência disso? A virtude não estaria aí? O que não é manipulado não seria aquele puro de coração e que não está preocupado com as diretrizes traçadas por um grupo religioso? É como se igreja invisível fosse tão INVISÍVEL que nos mostraria a ilusão dos movimentos religiosos que reinvidicam a verdade e se julgam donas do Deus Todo-Poderoso, quando apenas têm apenas um "deus"...

Enéias Teles Borges disse...

Cleiton: seu último parágrafo parece ser o "X" da questão. Os grupos religiosos colocaram Deus numa caixa hermeticamente fechada. Cada povo tem o seu "deus". Partindo do pressuposto de que uma religião esteja certa, qual seria o "deus" das demais? Seria razoável crer num Deus Todo-Poderoso feito sob encomenda? Não nos esqueçamos que o CREDO de cada grupo é uma espécie de "vestimenta de deus". Eu diria que seu ÚLTIMO PARÁGRAFO MERECE UM ARTIGO. Espero que você o desenvolva.

Anônimo disse...

Enéias,
(obs: postei o comentário abaixo no tópico errado)

Você tocou num ponto interessante e polêmico. Isso me lembra Feurbach que, em seu livro "Essência do Cristianismo" diz o seguinte: "A consciência de Deus é a consciência que o homem tem de si mesmo, o conhecimento de Deus é o conhecimento que o homem tem de si mesmo. Pelo seu Deus conheces o homem e, vice-versa, pelo homem conheces o seu Deus; ambos são a mesma coisa". Esse parece ser o deus (com "d" minúsculo) descrito em seu artigo. Certo?

Fico aqui me perguntando: Se, como você sugere, há deus para todos e cada um pode adotar ou inventar um para si mesmo, como saber se o "Deus todo poderoso", sobre o qual você discorre com eloqüência, é de fato o "verdadeiro" (com "D" maiúsculo)? Não seria ele uma invenção sua e, por conseguinte, mais um deus (com "d" minúsculo)?

Outra dúvida: Ao nos apresentar esse Deus verdadeiro você assim se expressa: "A Ele encontram-se ligados os seres pensantes, aqueles que rejeitam a manipulação.". Hum... Essa afirmação me soou um pouco forte, afinal, não somos todos seres pensantes? O pensar não é inerente à racionalidade humana? E se eu usasse a minha racionalidade para discordar de sua visão de Deus estaria automaticamente me desligado dEle? Podemos confiar na força do pensamento para chegar ao conhecimento autêntico do Deus verdadeiro? Tenho cá minhas dúvidas. Quanto à manipulação, assunto abordado em seu blog no artigo As classes quanto à manipulação, penso que todos somos manipulados. A diferença é apenas de grau.Em suma, essa frase pode dar muito "pano pra manga".

Sendo seu objetivo estimular a permanente reflexão, creio que o objetivo está sendo alcançado. É importante reavaliar sempre nossas crenças, convicções e conclusões. O processo é dialético: a verdade de hoje pode ser a mentira de amanhã.

Enéias Teles Borges disse...

Ebenézer: seu texto e outras mensagens me fizeram adicionar uma nota ao texto. De fato aquele Deus Todo-Poderoso pode ser objeto de minha criação...

Anônimo disse...

Enéias,

O acréscimo desse comentário é uma demonstração clara de honesta e humildade, virtudes indispensáveis àqueles que buscam a verdade. Parabéns!

Ainda sobre a existência de Deus (com "d" maiúsculo ou minúsculo) cito Rubem Alves:

Deus existe?
A vida tem sentido?
O Universo tem uma face?
A morte é minha irmã?
Ao que a alma religiosa só poderia responder: "Não sei. Mas eu desejo ardentemente que assim seja. E me lanço inteira. Porque é mais belo o risco ao lado da esperança que a certeza ao lado de um universo frio e sem sentido..."

(O que é Religião, pág. 101)

Luiz Claudio Santos de Souza Lima disse...

Prezado Dr. Enéas,

Inicialmente meus parabéns pelo post. Excelente exercício de pensamento livre.

É com grande satisfação que chego até aqui e tenho oportunidade de postar meu comentário.

Ainda tento entender não apenas o significado primário do título “Convictos ou Alienados?”, mas sua extensão e o chamamento a reflexão.

Debater e ter contato com o pensamento filosófico/teológico é excitante pelo resultado final de aprender com alguém com diferentes cosmovisões.

Presenciar o maior debate já realizado pela humanidade em todos os tempos e com acesso ilimitado da internet é algo de dimensões que superam nossa capacidade humana de assimilação de informações.

Portanto, a chance de uma alienação está ao alcance do mouse. Filtro e foco e algo que procuro neste mundo virtual ainda pouco regrado. Os blogues representam essas ilhas em alto mar para nos exploradores desse novo mundo.

Perceberás que este comentador é um ateu alheio ao proselitismo (se é que isso é possível!?) e um conciliador atento à todos os pontos de convergência. Essa é a minha forma de entender os resultados práticos de uma discussão.

A polarização resulta quase sempre num encastelamento de idéias. A convicção exagerada associada ao ego reduz nossa sensibilidade de compreensão.


Respeitosamente,

Luiz

CH disse...

Enéias,

Cheguei tarde mas tive a mesma percepção que você teve após a publicação do seu brilhante texto, que o levou a colocar a nota.

O Deus todo-poderoso seria apenas isto: mais um "deus humano" que faz uso de uma armadilha lógica para colocar a si mesmo fora do grupo de deuses humanos.

Por exemplo: Como saber se o deus cristão não é uma manifestação ou mesmo uma deturpação de Zeus, o deus grego (que seria o Todo-poderoso definitivo)?

Tantas "revelações"... todas dizendo "esqueçam o resto, essa aqui sim, é pra valer".

Usando um pouco de humor-negro, eu poderia dizer que Deus (o todo-poderoso) tem múltiplas personalidades e seria um argumento tão válido quanto qualquer outro a Seu respeito... logo... mesmo que tal Deus exista... ele está sujeito à nossa percepção Dele... me parece impossível refletir sobre Deus sem antes colocá-lo em uma embalagem de deus...

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