quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Momentos de cão sarnento - III

Momentos de cão sarnento - III
Enéias Teles Borges


Naquele primeiro mês a situação fervia “que nem” óleo em temperatura elevadíssima. Havia uma comoção sem fim. De uma maneira geral o que se pensava era lógico: onde há fumaça há fogo. Para muitos a coisa era pior do que parecia e para outros não era tudo assim. De qualquer modo não existia convicção de que estava tudo certo. O que causava mal-estar era simples: se estava tudo errado por que o cidadão tido como corrompido continuava em atividade? E se estava certo por que o denunciante não foi disciplinado eclesiasticamente pela apresentação de falso testemunho? O desconforto era montanhesco!


Por aqueles dias apareceu na casa do “cão sarnento” um senhor idoso, nascido no sul do Brasil, pastor aposentado. Segundo suas próprias palavras ele costumava atuar como bombeiro em situações e “que tais”. Depois de aposentado ele já havia exterminado incêndios gigantescos. Estava ali para apagar mais um. Disse ao nosso personagem que a iniciativa da visita partira de pessoas simpáticas à denúncia e que, segundo ele, queriam a solução correta para a lide e a reintegração do frustrado personagem ao trabalho, mesmo que em outra praça.

Ouviu a versão do lado de cá e assumiu o compromisso de retornar dois dias depois com soluções que, segundo suas palavras, deveriam ser de conformidade com a causa do denuncismo. Denuncismo, disse ele, que garbosamente insurgira-se contra a falta de vergonha do famigerado operador dos recursos, daquela instituição com mais de 70 anos de existência. Disse, à despedida, que já conhecia a fama do degenerado que antes de vir para São Paulo deixara suas digitais no departamento anterior, em outra unidade da federação.

Dois dias depois, numa pontualidade britânica o bombeiro retornou. Cabeça baixa, olhar abatido e com uma lista na mão. Tinha consigo os dezessete nomes de funcionários que seriam demitidos caso não houvesse um recuo do sarnento cão que instava em continuar latindo. Eram dezessete ex-colegas. Como prova de força demitiram três e os catorze seguiriam pelo mesmo rumo nos dias seguintes...

Havia uma “promessa”: caso houvesse um recuo os catorze não seriam demitidos e os outros três reintegrados ou alocados para outros pontos.

Começaram a surgir os efeitos da sarna do cão: ele que estava sendo corroído pela pestilência agora via os efeitos nefastos de seu estado pútrido sendo estendidos para outros viventes do meio. Três já estavam em estado terminal e catorze a caminho da UTI. O cão sarnento sentiu-se terrivelmente abalado. As circunstâncias que estavam no fundo do abismo começaram a notar o abismo se aprofundando em si mesmo...

Que loucura! O corporativismo implementado pelos carcarás sanguinolentos funcionava como um torniquete! Sentiram, os abutres, que o cão, por mais sarnento que ficasse, não haveria de recuar. Estava doente, mas seguia destemido. A artilharia foi estrategicamente remanejada na direção de terceiros. O efeito imaginado surtiu efeito. O cão sarnento ficou descadeirado. Naquela noite teve dificuldades atrozes. Não dormiu, não comeu, ficou quase entregue...

Os três demitidos, encontravam-se sorumbáticos, mas nada cobraram e até se sentiram honrados. Dos catorze ameaçados três debandaram. Dos onze restantes dois grupos se formaram. Aqueles que insistiram para que não houvesse recuo, ainda que eles também fossem demitidos.

O problema emergiu com força quando outros pediram para que houvesse a debandada. Eram pais de família com filhos ainda crianças e esposas em fase de estudo naquela instituição. Seria um prejuízo indescritível! Uma maldade imensurável...

Saibam, meus amigos, que cão sarnento, mesmo sendo muito corajoso, não deixa de ter coração a bater no peito. Notou que deveria carregar, sozinho, a pesada cruz. Deixou claro: abriria mão dessa luta momentânea, mas jamais desistiria da batalha final. Nosso personagem fez um pedido, protestando pela readmissão dos três afastados.

Observem: o remanejamento dos três demitidos foi o único fogo que aquele pastor idoso, de cabelos grisalhos, vindo do sul do Brasil conseguiu apagar.

As dezessete pessoas da lista do pastor grisalho têm histórias distintas que poderão ser descritas. Nosso personagem de forma objetiva aponta o que aconteceu com os três que debandaram de lado (mais detalhes, quem sabe, adiante): um foi exonerado por manter, durante vários anos, uma amante quase na própria casa. Outro, que era casado, por optar por procedimentos homossexuais. O terceiro foi expulso de casa pela esposa por envolvimento simultâneo com outras três mulheres casadas da comunidade dos fiéis...

Parece exagero? Esperem até saber os desdobramentos com os demais e em especial com aquele: o enviado especial das hostes espirituais da falta de decoro.

Continua...
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2 comentários:

Cleiton Heredia disse...

Esta terceira parte trouxe-me algumas dúvidas:

1) Nestas alturas do campeonato nosso personagem continuava exercendo suas atividades no colégio ou já tinha sido demitido?

2) Estes 17 personagens que serviram para pressionar nosso personagem tinham culpa no cartório? Participaram de alguma forma na fraude daquele larápio?

3) Quais eram as ações que nosso personagem pretendia tomar que exigiriam recuo por parte da máfia institucional e eclesiástica?

4) O fraudador agiu e desfrutou do dinheiro roubado sozinho? Se não, a corrupção se estendia até que níveis dentro da organização?

5) Pelo que entendi, existiam provas documentais do desvio de verbas feito pelo safado. Então porque o caso não foi parar na polícia?

Enéias Teles Borges disse...

Cleiton:

(1) Nunca houve demissão técnica do nosso personagem. Ele foi posto de férias e para receber seus direitos precisou ajuizar ação trabalhista. Não recebeu qualquer valor, inclusive diferenças de salários, férias (duas vencidas) e outros...
(2) Os personagens eram pessoas que simpatizavam com a causa, sendo que sete deles foram as que trouxeram o assunto à tona.
(3) Já tinha tomado algumas atitudes e entre elas na empresa que enviava recursos para os alunos. Além disso e via advogado foi feita uma denúncia específica nos orgãos oficiais competentes.
(4) o fraudador agiu sozinho, mas o superior imediato tinha se beneficiado de algumas coisas consideradas como "tráfico de influência" e ficou emparedado. Não tinha "moral" para agir e cruzou os braços. Havia, não só nessa instituição, algo conhecido como desvio de finalidade. os recursos entravam tecnicamente para um fim e eram usados para outros.
(5) Os papéis foram disponibilizados para as autoridades eclesíásticas e para os órgãos competentes. Recuar seria parar por aí, não acompanhar mais aquilo que já tinha sido iniciado e "permitir" que houvesse "abafamento" do que já tinha sido iniciado.
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Mais adiante tudo isso ficará mais claro.

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