terça-feira, 30 de novembro de 2010

Qual a essência do casamento?

Estaríamos errados ao afirmar que na essência do casamento estão contidos: a promessa de amar o outro para sempre? Continuar junto do cônjuge até que a morte promova a separação? Viver para fazer o outro feliz?

Neste mês de maio eu tive o privilégio de fazer a apresentação de um casal. Em outras palavras: fazer a cerimônia de casamento de duas pessoas cristãs, mas que não são da mesma agremiação religiosa. Não é a primeira vez que exerço esse maravilhoso ofício e certamente não será a última. Acontece que as organizações cristãs têm a característica de só oficiar casamento quando os pretendentes são da mesma “fé”, isto é: do mesmo ente proselitista.

No caso em voga não importa o amor entre os noivos, o caráter de cada um, do histórico irrepreensível dos futuros esposos ao longo da vida. Mais importante para as igrejas e seitas é que se esteja sob a mesma praxe doutrinária. E a essência do casamento é menos importante?

Tenho ouvido de algumas pessoas, ao longo dos meus 45 anos de vida, frases mais ou menos assim: “prefiro que meu (minha) filho (filha) fique solteiro (solteira) a casar com alguém que não seja da minha igreja...” Notem que a preferência principal não é pela felicidade, pela consolidação do amor, mas pela junção de pessoas que pertençam ao mesmo ente dogmático.

Não condeno tal atitude, mas faço ressalvas. Até ouso perguntar: o que você prefere para um querido seu, um casamento com alguém da sua igreja, num primeiro plano, ou que esse seu amado se case com alguém de boa índole? É lógico que a resposta não pode ser: “prefiro as duas coisas”! E quem não prefere?

Ocorre, meus amigos, que a estatística está aí para comprovar que nas igrejas cristãs o número de mulheres está superando ao de homens. De sorte que será impossível que todas as excelentes donzelas se casem com pessoas da mesma profissão de fé.

É hora de preparar instrutores para curso de “descasados” (solteirões, viúvos e similares). Curso para casados (nesse contexto) é moleza!

Outro curso fundamental: “como ser solteirona no século XXI”?

Adianta essa conversa de que Deus proverá? Proverá forças para que a donzela consiga viver só? Convém esperar que o mesmo Deus que multiplicou os pães e peixes multiplique homens bons para todas as mulheres solteiras?

Outro detalhe que tem sido deixado ao largo: como uma mãe que está casada, teve lua-de-mel e uma boa vida conjugal, terá experiência (e coerência) para dizer para a filha: “é melhor ficar solteira do que casar com alguém de outra igreja?”

E se a filha perguntar: “mãe, como é ser solteirona?”. É fácil preferir algo para uma filha sem se colocar no lugar dela...

Faço um convite à reflexão: qual a essência do casamento para você? O casamento com pessoas da mesma instituição é garantia de sucesso? Casamento entre pessoas cristãs, mas de grupos diferentes, é certeza de infelicidade?

Tenho a convicção de que o casal que apresentei, numa linda cerimônia de casamento, tem todos os ingredientes para ser feliz. Especialmente porque o amor foi colocado acima do “instituto proselitista da fé ortodoxa”.

Quando o amor mútuo se põe em evidência, coisas de menor importância saem de cena. Pessoas que se amam com certeza caminharão juntas rumo à convergência, inclusive a da fé. Essa convergência não significa que um passará a adotar a fé do outro. Poderá ser que essa convergência seja a aceitação e respeito às concepções religiosas que cada um tenha...

Por hora eu continuarei exercendo esse privilégio, caso seja convidado, de fazer outros cerimoniais. É fundamental que os noivos tenham em mente a essência do casamento e estejam dispostos a amar um ao outro, a despeito das diferentes formas de exercer o livre arbítrio religioso.

Nota: importante que não pairem dúvidas! Notem que o texto está preso a casamento de cristão com cristão. Exemplificando: batista com metodista, adventista com presbiteriano, etc. As igrejas, em geral, só fazem o casamento se os dois forem rigorosamente da mesma denominação.

Enéias Teles Borges
Postagem original: 26/05/2008
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13 comentários:

Cleiton Heredia disse...

Este assunto não é tão simples como você colocou. É claro que se tratando de dois jovens cristãos, porém de denominações diferentes, a situação se torna bem menos complicada.

Mas vamos pensar em um jovem do candomblé e uma jovem Igreja Universal. Ambos são de excelente índole (caráter) e se amam apaixonadamente acima de tudo. Você oficializaria este casamento?

Bem, vamos supor que eles se casem e que venham os filhos. O que você acha que acontecerá? O pai vai querer leva-los no candomblé para serem batizados conforme os costumes daquela religião e depois irá querer instruí-los a se tornarem pais e mães de santo.

Já a mãe jamais admitirá tal coisa, pois segundo as orientações de seu credo religioso, tal coisa seria o mesmo que entregar seus filhos nas mãos do diabo em pessoa.

Caso estejamos falando de duas pessoas fervorosas em suas crenças, este tipo de divergência é irreconciliável, e as consequências futuras na vida do casal e especialmente dos filhos tem tudo para não serem nem um pouco favoráveis.

Enéias Teles Borges disse...

Cleiton:

Eu fiquei adstrito ao mundo cristão convencional. Falo de católicos, batistas e semelhantes. É óbvio que não seria possível conciliar um cristão com um satanista. Mas não seria possível um batista com um testemunha de jeová, um adventista com um presbiteriano?

Qual a desculpa aí, a não ser o proselitismo?

Abraços.

Cleiton Heredia disse...

Então tá! Vou entrar no jogo e limitar a discusão ao mundo cristão.

Vamos imaginar então um fervoroso jovem adventista do sétimo dia que acredita piamente que sua igreja é o remanescente de Deus e entende ser os demais como babilônia e suas filhas, casando-se com uma fervorosa jovem da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias que espera pelo arrebatamento secreto a qualquer momento.

Quando vierem os filhos o problema passará a existir em menor ou maior grau. Tanto pai como mãe irão querer ver seus filhos na igreja ao qual pertencem, pois acreditam que ali está a verdade, sendo que o outro lado está obviamente com a mentira.

Ambos podem até se respeitarem e tolerarem a crença um do outro, mas em relação aos filhos a coisa tenderá a ser bem diferente.

Quanto mais fanáticos forem ou ficarem o casal em relação às suas convicções religiosas, mais problemas poderão ser colhidos no futuro.

Geralmente quando estes conflitos vêem a tona, um dos lados acaba cedendo na tentativa de preservar o casamento, mas isto nunca acontece sem que um sentimento de revolta e insatisfação seja camuflado pela parte que se submeteu. Estes sentimentos ao longo do relacionamento, com grande probabilidade, minarão qualquer união inicialmente estável.

Enéias Teles Borges disse...

Cleiton:

Para começo de conversa um fervoroso adventista jamais abriria a porta para esse tipo de relacionamento. No momento em que ele se julga luz e o outro trevas pára por aí... Do outro lado a mesma coisa.

Aí estamos diante de pessoas que crêem na salvaçã VIA IGREJA. Numa situação assim eu jogaria a toalha.

Neste caso eu não participaria do cerimonial. Veja o final do meu texto, logo abaixo:

"Por hora eu continuarei exercendo esse privilégio, caso seja convidado, de fazer outros cerimoniais. É fundamental que os noivos tenham em mente a essência do casamento e estejam dispostos a amar um ao outro, a despeito das diferentes formas de exercer o livre arbítrio religioso."

Note que deixei bem claro...

Abraços.

Cleiton Heredia disse...

Enéias, creio que estás menosprezando quão forte e inconsequente podem ser dois corações apaixonados.

Por maior que seja o fervor religioso, quando o amor chega na força de uma paixão arrebatadora, começa um processo de racionalização da fé buscando justificar aquilo que o coração pede. Normalmente o que se pensa é que com o tempo a outra parte será conquistada para a "verdade" (sua denominação) - e isto pode acabar não acontecendo.

Vamos voltar ao ponto nevrálgico: Algumas denominações religiosas não "oficializam" casamentos com jugo desigual em relação as crenças, mesmo que sejam ambas cristãs, por uma simples questão de proselitismo, ou por acreditarem que tais uniões têm grandes chances de não serem promissoras?

Como eu havia comentado, respeito ao livre arbítrio religioso um do outro poderá até existir, mas será que respeitarão o livre arbítrio dos filhos em formação? Não tentarão cumprir as ordens de Deus em Deut.6:7 cada um a sua própria maneira ou como entende ser a verdade?

O texto que encerra sua postagem é em tese muito bonito, mas tenha cá minhas dúvidas se a prática já vivenciada por muitos casos similares correspondem à sua teoria.

Quero dizer que até entendo um pouco seu ponto de vista, mas quero também faze-lo entender que quando se trata de duas pessoas que seguem a um Deus que exige um amor maior ao que se tem pelo cônjuge ou outro ser qualquer, o respeito a liberdade do outro pode ser confundido com infidelidade a Deus e a "verdade".

Enéias Teles Borges disse...

Cleiton:

Veja como a situação vai evoluindo na marra: no nosso caso (ASD): quando um membro contraía matrimônio com alguém de outra fé, o que acontecia? Disciplina ou não? Hoje ficamos apenas "no campo" do aconselhamento.

O que estamos nos esquecendo é que a distância absurda que existia entre uma denominação e outra não existe mais...

Outro ponto que precisa ser ponderado: a sugestão, em caso de não achar um par na própria denominação, é ficar solteiro (a)?

Considerando que grande parte das igrejas cristãs vivem uma CULTURA RELIGIOSA e NÃO uma religião, o que tem efetivamente acontecido? Proselitismo meu amigo. Nada mais que isso.

Em qualquer igreja no Brasil é possível encontrar a tendência que se quer. Na IASD temos desde a ortodoxia total até o pentecostalismo efetivo. Ninguém quer admitir! E no que tange a ICAR? Tirando fora um ponto ou outro, qual a diferença hoje? Desde que tenhamos incorporado uma tese central da ICAR como podemos dizer que somos tão diferentes assim?

Neste caso não estamos mais falando de união com pessoa de uma fé diferente, mas unir com uma pessoa de uma cultura religiosa diferente.

Esse assunto é pano para a manga.

Digo mais: será impossível fugir desse tema no quadro atual, assim como será impossível fugir do tema homossexualismo, aborto...

Como eu disse: caso não concordemos com a união entre pessoas de fé diferente pelo menos precisamos instruir pessoas para ministrar cursos para "descasados" e "solterões...".

De qualquer forma sinto que devo manter, na íntegra, a idéia do meu texto.

O tempo certamente mostrará que há uma diferença capital entre captação de prosélitos e um só rebanho e um só Pastor...

Saudações.

Ricardo disse...

De minha parte torço apenas pelo bem estar dos meus filhos e futuros netos. Casados, descasados, recasados, pouco me importa.

Quanto a preferir que a filha(o) fique solteira(o) a se casar com alguém de outra denominação religiosa, ou mesmo um ateu, é coisa de gente egoísta, que de tão egocentrica pretende fazer escolhas a respeito de uma vida que não lhe pertence. Coisa de gente besta.

Ricardo disse...

De minha parte torço apenas pelo bem estar dos meus filhos e futuros netos. Casados, descasados, recasados, pouco me importa.

Quanto a preferir que a filha(o) fique solteira(o) a se casar com alguém de outra denominação religiosa, ou mesmo um ateu, é coisa de gente egoísta, que de tão egocentrica pretende fazer escolhas a respeito de uma vida que não lhe pertence. Coisa de gente besta.

Anônimo disse...

Não seria mais fácil se fôssemos mais tolerantes? Sou espírita e iniciei um relacionamento com um adventista, mas depois de ler várias coisas sobre a religião dele estou seriamente desanimada (e triste) com a possibilidade de qualquer coisa frutífera! Os espíritas tbém são cristãos e seguem as leis divinas, mas por nossas especificidades somos até mesmos discriminados, o que já me faz imaginar que, mesmo com todo meu empenho na caridade e na elevação moral, não serei aceita no âmbito familiar dele...
Veja bem, como isso chega a ser desesperador! Se quisermos nos relacionar, um dos dois terá que abdicar de sua liberdade individual de escolha de crença? Quer dizer então que o amor realmente necessita de rótulos?!
Apesar das diferentes metodologias, o objetivo afinal não é o mesmo? Servir a Deus e caminhar no bem? Viver na caridade e na ética? Eu não veria problemas em ter meus filhos frequentando a igreja do pai ou qualquer igreja (nas suas escolhas no futuro, qdo adultos) que professasse a fé em Deus e nos princípios cristãos. Mas, infelizmente, temo que não terei a mesma receptividade do "outro lado", o que me faz desde já cogitar o fim do relacionamento, lamentando a possível perda da chance de um casamento entre pessoas de bom caráter simplesmente porque os seres humanos resolveram fazer a mesma coisa só que de formas diferentes.

Cleiton Heredia disse...

Amigo, naquela época esta postagem deu pano prá manga, hem?

Ainda não tinha lido o comentário da Cristiane. Tadinha...

Acredito que a esta altura seu relacionamento com o adventista já tenha terminado, pois pelo que conheço da religião adventista e do espiritismo, tal união dificilmente daria certo.

Imagina o adventista explicando para ela que os supostos espíritos de luz que se comunicam com ela são (de acordo com a crença dele) espírito de demônios, ou que o espiritismo é criação do Pai da Mentira, o Diabo.

Por outro lado, conheço um casal que a esposa é adventista e o marido é médium espírita. Já estão casados a mais de 20 anos, mas a esposa não cansa de pedir nos cultos de oração que Deus arranque seu marido das garras do Diabo.

Você não acha que os religiosos são muito complicados?

Sabrina Noureddine disse...

Creio que a verdadeira religião auxilia a pessoa a ser melhor, a cultivar as virtudes: respeito, tolerância, amor ao próximo, solidariedade, enfim...

Sendo assim, não haverá problema em casamentos com pessoas de bem e com crenças diferentes, sou um bom exemplo: sou católica (com grande admiração pelo espiritismo, religião da minha avó) e casei com um muçulmano na igreja católica. Temos rituais diferentes mas existe respeito.

Cleiton Heredia disse...

É Sabrina...

O problema é que existe uma grande diferença entre verdadeira religião (atualmente entendida como ecumênica e liberal) e religião verdadeira (entendida pelos os que assim se julgam como ortodoxa e fundamentalista no seu mais alto grau).

Religiosos que levam sua religião como uma mera cultura religiosa podem suportar com tranquilidade o "jugo desigual". Isto já não acontece com aqueles que entendem que são os únicos detentores da verdade.

Sabrina Noureddine disse...

Esse sempre foi o grande problema da humanidade, acreditar que alguém pode ser o único detentor da verdade..., não é mesmo?
O que é a verdade? E, existe verdade absoluta?
Essa já é, por si só, uma grande questão filosófica... acrescida da questão religiosa ainda...
Nesse aspecto verifico com maior frequencia o exercício diário e contínuo da tolerância e respeito ao que é diferente...
Até porque não foram poucas as pessoas que se espantaram com meu casamento (o interessante é que não senti isso qdo estive com a família do meu marido - todos muçulmanos...).
Conforme vivenciamos realidades diferentes aprendemos cada vez mais... é a minha opinião.
Abs.

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