sábado, 26 de novembro de 2011

O céu e o esquecimento

E Deus limpará de seus olhos toda a lágrima; e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor; porque já as primeiras coisas são passadas (Apocalipse 21:4).

Já ouvi muitos sermões tendo esse verso como base. A despeito da beleza de seu conteúdo um mal-estar sempre me cercava e hoje eu consigo entender o motivo de tanta angústia que me acometia. É que hoje eu sou pai.

Imaginem a seguinte situação:

Uma mãe está vendo a casa pegar fogo. Tenta entrar para salvar seu filho entre as chamas. Os bombeiros não deixam e dizem que não há como salvar mais a criança. Nem eles podem. Mesmo assim a mãe insiste em tentar, mas não consegue. As pessoas a seguram. Ela diz que não poderá viver sem o filho, prefere morrer com ele. Uma pessoa lhe diz: “não se preocupe, depois que tudo acabar nós lhe daremos um remédio e você nem sofrerá com isso; poderá até se lembrar, mas não terá mais sofrimento”. Qual a mãe, de coração puro, que aceitará esse argumento? Qual mãe quererá um remédio que a faça esquecer da dor e da sua prole?

Você conhece alguma?

Essa passagem do livro do apocalipse muitas vezes foi apresentada assim. Os pais devem “ensinar” o caminho aos filhos e a missão paterna estará concluída. E se os filhos não forem para o céu?

O pregador sempre dizia que um remédio seria ministrado. Não haveria mais dor para os que fossem para o céu. Até se lembrariam dos queridos que se perderam, mas tudo não passaria de uma simples lembrança sem dor...

Eu sempre me perguntei se o céu seria interessante nessas condições. Quem disse que eu quero me esquecer de certas coisas? Não me empolgo com essa anestesia da mente que seria aplicada em mim. Eu me preocupo com minhas filhas até no que se refere às pequenas coisas, como não me preocuparia com conseqüências eternas?

Prefiro pensar que esse verso sempre foi mal interpretado. Sempre vi essa interpretação como uma expressão de egoísmo...

Enéias Teles Borges
Publicação Original 03/04/2008

4 comentários:

Cleiton Heredia disse...

Então analise está outra interpretação:

Se Apocalipse 21:4 fala que Deus enxugará todas as lágrimas, é porque no céu haverão lágrimas para serem enxugadas.

Assim como uma mãe ou um pai chora a perca de um filho, este choro a princípio é intenso e a dor praticamente insuportável, porém com o passar dos anos, este choro vai diminuindo de intensidade e a pessoa aprende a conviver com a dor (a vida precisa continuar para quem fica - não é isso que dizem?).

Pergunte para uma mãe, com seus mais de 80 anos, o que ela sente ao lembrar de seu filhinho que morreu com apenas 7 anos. Ela vai se lembrar de toda a dor e tristeza que isto lhe causou, vai ficar triste e poderá até chorar. No entanto este choro não será como aquele ao lado do caixão, nem a dor será tão aguda quanto foi ao voltar para casa e ver o quarto de seu filhinho vazio.

Imaginem agora que esta mesma senhora viva mais 1000 anos. Será que os sentimentos gerados pela lembrança da morte de seu filhinho serão os mesmo que aqueles quando tinha 80 anos? E depois de 10.000 anos? E depois de 100.000 anos? E depois de 1.000.000 de anos?

Você já deve ter entendido onde quero chegar. O verso bíblico não fala das lágrimas sendo definitivamente enxugadas no 1º dia no céu, nem fala de qualquer prazo para a dor e o choro deixarem de existir.

A meu ver este verso pode ser interpretado da perspectiva de que a eternidade ao lado de Deus se incumbirá de prover o lenitivo definitivo.

Anônimo disse...

Enéias,

O curioso é que textos como os da Bíblia são passíveis de várias interpretações. A interpretação proposta pelo Cleiton faz sentido, mas ainda assim (como ele mesmo disse), é "uma" interpretação. Outros poderão enxergar, nesse texto, um sentido bem diferente.

Anônimo disse...

Sei que essa postagem foi feita há muito tempo e que provavelmente o autor nem se lembra do que foi escrito. Mas, enfim, vai minha opinião.

O seu ponto de vista é razoável. Por diversas vezes me peguei na mesma reflexão: como eu posso abraçar uma eternidade ao lado de Deus sabendo que pessoas que viveram e cresceram comigo, que cuidaram de mim, estão sendo eternamente atormentadas no inferno.

A pessoa que eu mais amo é a minha mãe e pensar na possibilidade de eu estar no "céu" e ela no "inferno" faz meus olhos encherem de lágrimas agora mesmo.

Por isso que as vezes eu me perco em orações pedindo a Deus que salve todas as pessoas que me são importantes (e Ele certamente pode fazê-lo, se quiser), mas isso já é problema meu.

A questão é: Deus deixou bem claro que pessoas entrarão nos céus e quais serão os reprovados. Mas ele não apenas vai fazer justiça: ele vai mostrar a justiça sendo feita, de modo que "toda boca se cale". Isso significa que mesmo que nós soframos com a decisão dele, nós não teremos como contra-argumentar, por que vamos ver a justiça sendo feita.

Agora, é claro, isso não significa que nós não possamos sofrer por isso, não é? É aí que entra esse verso, por que Deus sabe o que você, eu ou qualquer outro vai sentir. Então, ele estará lá para nos consolar pelo tempo que for necessário.

Aquam Dixit disse...

Muito boa postagem, caríssimos ^^

(Numa plêiade filosófica, a qual certamente é luz para os que caminham :)

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