terça-feira, 16 de junho de 2009

VERGONHA DE TER MEDO?

De tanto conviver com as mazelas do mundo o ser humano vai se acostumando e chega ao ponto de não mais se assustar com a escalada do caos.

Hoje a manchete (que está se tornando comum) diz respeito a mais um acontecimento horrendo promovido por forças naturais. Refiro-me ao terremoto na China que ocasionou o falecimento de milhares de pessoas. Notem que falo de milhares de pessoas! Enfatizo: os corpos são contados aos milhares!

Qualquer explicação, vinda de evolucionistas ou de criacionistas, deveria causar pavor. O evolucionista poderia dizer muito, inclusive alegar que por mais bizarro que isso possa parecer é natural que ocorra. Quer seja por culpa do próprio homem, quer seja por qualquer outra razão. O criacionista poderia, igualmente, dizer muito, inclusive proclamar em alta voz que é chegada a hora do juízo. Não importa qual seja o motivo suscitado, o pior, em tese, ainda está por vir.

Mesmo assim e a despeito dos alarmistas de plantão, atuando a todo vapor, a humanidade vai se acostumando com o caos. Tsunamis? Vendavais? Furacões? Milhares de mortes? Tudo, absolutamente tudo, está entrando para a rotina e sendo olhado com absurda indiferença. Não se trata exatamente de descaso, mas de indiferença. Está acontecendo com tanta freqüência que o homem está se acostumando (ou adaptando).

Quando as pessoas estão acomodadas em berço esplêndido já é desagradável. E a acomodação no berço do caos?

Parafraseando Rui Barbosa eu até diria: de tanto ver a catástrofe cair sobre a terra o homem está perdendo o senso do perigo e até sentindo vergonha de ter medo.
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Postagem original: 12/05/2008.
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3 comentários:

Cleiton Heredia disse...

Catástrofes e tragédias que ceifam rapidamente milhares (ou milhões) de vidas sempre existiram e continuarão a existir:

- Uma epidemia semelhante a "peste negra" dizimou o Império Romano entre os anos de 165 e 180 d.C.;

- Três séculos mais tarde veio da Índia a "peste bubônica", atingindo Constantinopla em 542 d.C. e espalhando morte por toda a Europa;

- Em 1348 d.C. foi a vez da "peste negra" se espalhou rapidamente por toda Europa, e cidades como Paris, Hamburgo, Florença e Veneza perderam metade (ou mais) de sua população. Estima-se que talvez 20 milhões de europeus tenham morrido vítimas da peste (uma em cada três pessoas);

- Quando os espanhóis começaram a colonizar as Américas, trouxeram juntamente com eles a coqueluche, a varíola, a difteria, a escarlatina, a catapora e a malária. Estas doenças mataram um terço da população nativa (no México estima-se que 8 de cada 10 habitantes tenham morrido);

- Em 1918-1919 foi a vez da gripe espanhola onde estima-se que contaminou 50% da população mundial, matando entre 20 a 40 milhões de pessoas;

Isto sem falar dos terremotos, maremotos, furacões, erupções vulcânicas e tsunamis que ao longo da história sempre causaram grandes tragédias.

Fica complicado falar em sinais dos tempos quando o mundo sempre conviveu com todas estas tragédias e catástrofes. O pior está ainda por vir? Tenho minhas dúvidas. O que poderia ser pior que um meteoro de proporções gigantescas caindo sobre a Terra e destruindo praticamente toda a vida? Segundo os cientistas isto já ocorreu na pré-história.

Não se trata de indiferença ou descaso, pois quem conhece bem a história deste mundo sabe que ele é um lugar bem perigoso para se viver.

E mais, milhões morrendo do outro lado do mundo não tem o mesmo impacto que apenas um, que você conhece e ama, morrendo ao seu lado.

JulianoCG disse...

nossa adaptabilidade é uma faca de dois gumes, pois se por um lado deixams de ver as mazelas do mundo, um médico se desestababilizaria sempre algum paciente morresse.
a arte está em manter nossa indignação onde elas não só cabe, mas é necessária e atenuá-la quando preciso. o discernimento vem com a prática.

CH disse...

Tenho um amigo bombeiro voluntário acostumado a prestar socorro em acidentes de trânsito e a recolher o que sobra quando não há mais o que fazer. Perguntei a ele certa vez o que sentia ao ver aquelas cenas. Ele me disse que não humanizava o que via, os corpos, para ele, seriam apenas restos de uma coisa qualquer, que não um ser humano. Assim, no máximo dá um pouco de nojo, mas acostuma.

Contou-me também que, na única experiência que fez consigo mesmo, quando ousou ir ao enterro de um rapaz que havia "recolhido" certa vez, passou a sentir a perda do rapaz como se fosse um amigo próximo. A dor levou dias para passar. Aquele resto de carne agora tinha nome e história.

Outro exemplo, a tragédia das chuvas daqui de SC, em que um colega próximo perdeu NOVE parentes, incluindo pai e mãe, de uma hora pra outra, sendo ele o único sobrevivente de um desabamento, causou-me comoção infinitamente maior do que a queda do avião da AirFrance. Apenas ao ler sobre as pessoas que estavam no avião, sobre suas vidas, seus projetos, seus sonhos, me dei conta da magnitude real do evento.

Parece-me que os números não fazem muita diferença quando não temos nenhuma ligação sentimental direta ou indireta com o fato. Bem dizem que a morte de um ser humano é uma tragédia, mas a morte de muitos é uma estatística.

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