
Alienação é o fenômeno pelo qual os homens criam ou produzem alguma
coisa, dão independência a esta criatura como se ela existisse por si
mesma e em si mesma, deixam-se governar por ela como se ela tivesse
poder em si e por si mesma, não se reconhecem na obra que criaram,
fazendo-a em ser outro, separado dos homens, superior a eles e com poder
sobre eles.
Na alienação social, os seres humanos não se reconhecem como produtores
de instituições sociopolíticas (como, por exemplo, o Estado, a família, o
casamento, a propriedade, o mercado, etc.) e oscilam entre duas
atitudes: ou aceitam passivamente tudo que existe, por ser tido como
natural, divino ou racional, ou se rebelam individualmente, julgando
que, por sua própria vontade e inteligência, pode mais do que a
realidade que os condiciona. Nos dois casos, a sociedade é o outro
(alienus), algo externo a nós, separado de nós e com poder total ou
nenhum poder sobre nós.
A alienação social se exprime numa "teoria" do conhecimento espontânea,
formando o senso comum da sociedade. Por seu intermédio, são imaginadas
explicações e justificativas para a realidade tal como é diretamente
percebida e vivida.
Um exemplo desse senso comum aparece no caso da "explicação" da pobreza,
em que o pobre é pobre por sua própria culpa (preguiça, ignorância) ou
por vontade divina ou por inferioridade natural. Esse senso comum
social, na verdade, é o resultado de uma elaboração intelectual sobre a
realidade, feita pelos pensadores ou intelectuais da sociedade –
sacerdotes, filósofos, cientistas, professores, escritores, escritores,
jornalistas, artistas -, que descrevem e explicam o mundo a partir do
ponto de vista da classe a que pertencem e que é a classe dominante da
sua sociedade.
Essa elaboração intelectual incorporada pelo senso comum social é a
ideologia. Por meio dela, o ponto de vista, as opiniões e as idéias de
uma das classes sociais – a dominante e a dirigente – tornam-se o ponto
de vista e a opinião de todas as classes e de toda a sociedade.
A função principal da ideologia é ocultar e dissimular as divisões
sociais e políticas, dar-lhes a aparência de indivisão e de diferenças
naturais entre os seres humanos. Indivisão: apesar da divisão social das
classes, somos levados a crer que somos todos iguais porque
participamos da idéia de "humanidade", ou da idéia de "nação" e
"pátria", ou da idéia de "raça", etc. Diferenças naturais: somos levados
a crer que as desigualdades sociais, econômicas e políticas não são
produzidas pela divisão social de classes, mas por diferenças
individuais de talentos e de capacidades, da inteligência, da força de
vontade maior ou menor, etc.
A produção ideológica da ilusão social tem como finalidade fazer com que
todas as classes sociais aceitem as condições em que vivem, julgando-as
naturais, normais, corretas, justas, sem pretender transformá-las ou
conhecê-las realmente, sem levar em conta que há uma contradição
profunda entre as condições reais em que vivemos e as idéias.
(Marilena Chaui cita em seu livro O que é Ideologia)