
Nasci no interior de Minas Gerais e fui criado, até os 17 anos, no Sul da Bahia. Repassando minha vida, nas muitas noites passadas em claro, pude vislumbrar como vi o tédio adentrando minha vida e dela não mais saindo.
A partir dos 17 anos de idade eu morei numa grande cidade, a maior do Brasil. A despeito da agitação local o tédio continuou tomando conta da minha vida. Quando me refiro ao tédio eu deixo de lado o meu convívio social e também a minha vida doméstica. Fato é que nos momentos de quietude percebo que meu viver é tedioso.
Minha vida foi ditada por costumes religiosos que não escolhi. Nasci num lar ortodoxo, de concepções fechadas e fui formado assim. Minha mente ao longo de várias décadas foi moldada para pensar apenas numa direção.
Esta direção única foi denominada de livre arbítrio. Em palavras diretas e claras eu recebi um mapa que apontava um único caminho e fui induzido a crer que este caminho que trilhei foi de minha espontânea escolha.
Quando penso nisso tudo eu fico triste. Sinto que vivo numa ilusão. Aquela de ter uma vida social comum, normal e até tida como muito boa. Vida financeira relativamente equilibrada, família sólida e dada à cultura humana e religiosa. Tenho até um cachorrinho! Mas devo ser sincero: é tédio infinito que envolve minha vida e dilacera minha alma.
A rotina é uma chatice sem fim. Até um rápido momento de paz se esvaiu. Meus 45 anos de vida foram ligados aos finais de semana com ênfase religiosa nos cultos sabáticos. Hoje vejo que a liturgia a qual assisti por mais de quatro décadas contribuiu decisivamente para aumentar (e muito!) o meu tédio.
Como seria bom se pudéssemos viver com mais alegria, sem rotina, sem ladainhas, sem repetições horrendas!
Até componho um poema:
A rotina que me mata aos poucosMinha vida é de uma rotina sem fim,
Que abate meu ânimo, que me causa dor,
Tirando sempre a alegria de minha alma,
Ao me empurrar para constante amargor.
A rotina é obra humana, tentando moldar o mundo,
Muitas vezes assegurando que é vontade divina,
Para liberdade de todos no exercício do livre arbítrio,
Quando de fato lança o espírito em direção à ruína.
Tenho uma leve esperança de me livrar das amarras,
Desconsiderando a opinião dos baluartes do tédio,
Viver uma vida de verdade em completa e honesta alegria,
Enxergando a vida como ela é. Colorida e sem tédio.
Foi de improviso e sem preocupação com a métrica, boa rima e tudo mais. Mas não seria uma apologia do tédio tentar fazer um poema dentro de um regramento? Não se pode conspirar contra o tédio usando o arrazoado que lhe é peculiar.
Lembro-me de uma frase repetida por um locutor esportivo:
... vivendo a vida, colorida e gostosa de ser vivida.
Aqui não se faz a defesa do caos, nem se defende a tese dos promotores de algaravia. Mas estamos numa luta constante contra aqueles que fazem da vida uma eterna penitência da alma. Num permanente negócio com Deus, em busca de um novo lar, que segundo descrição modorrenta será um paraíso do tédio.
Faço um convite à reflexão: o tempo está passando e você está preso a uma rotina. Será que já se apercebeu disso? Será que já notou que as respostas que lhe são oferecidas são meros paliativos? Verificou que não tem segurança quanto ao que crê e vê?
Um amigo meu, psicólogo me disse que o primeiro passo para fugir do tédio contemporâneo é admitir que ele existe e está bem perto. Disse também que todos terão um encontro com essa realidade. Pode ser que no último dia da vida (a menos que morra de forma acidental), mas não há como fugir.
Haverá (se ainda não houve) um momento no qual as pessoas terão um encontro particular com a verdade. Depressão? Ausência de Deus? Medo da morte? Não sei bem. Mas o que se pode afirmar que o encontro com a realidade atingirá a todos e em especial os hipócritas. Quem se safará disso? Talvez os alienados...
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